quinta-feira, 18 de setembro de 2008

:: Crise

Ao longo da evolução do capitalismo percebe-se que a relação entre Estado e economia sofreu profundas alterações. Durante os séculos XVIII e XIX imperou a lógica liberal. Estado e economia não se misturavam. Cada um no seu quadrado. Adam Smith criou a metáfora da Mão Invisível do Mercado para expressar a idéia de uma auto-regulação do mercado, através do mecanismo infalível da Lei de Oferta e Procura.

Foi um período de forte crescimento econômico. Não demorou muito para que empresas norte-americanas se tornassem gigantescas corporações. Nas primeiras décadas do século XX tudo ia muito bem, especialmente porque a Europa, arrasada pela I Guerra, precisava importar quantias significativas de produtos dos Estados Unidos, o que estimulou investimentos em ações destas empresas. Mas então, no final da década de 1920, com a economia já recuperada, a demanda por importações na Europa é reduzida drasticamente, o que derruba o valor das corporações americanas. Procurando reduzir as perdas, muitos investidores colocam suas ações a venda. Foi então que a Lei da Oferta e Procura passou sua 'mão invisível' na bunda do mercado. Crise generalizada.

Mudança de planos. O Estado precisava retomar investimentos, arrumar a bagunça e dar novos rumos à economia. Foram longas décadas de Keynesianismo. Até que o Estado, pesado demais para sustentar seu próprio tamanho, começa a reduzir sua participação direta da economia. Privatizações, concessões à iniciativa privada, corte de investimentos. Nesse contexto, muitas corporações já tinham superado em importância econômica países inteiros. Pressionados, os Estados passam a regular câmbio, controlar juros, emissão de moeda, defender fronteiras e passaram a atuar na economia como coadjuvantes. O circo no neoliberalismo estava armado.

Eis que, numa semana bastante conturbada, uma série de empresas do setor financeiro norte-americano decretam falência. Entre elas, o segundo maior banco do país e a terceira maior seguradora do mundo. Mas o que surpreende é o que vem depois: o governo dos Estados Unidos injetam bilhões de dólares para estatizar estas empresas e evitar o pior, um revival de 1929.

Fica a sensação de que o neoliberalismo foi colocado contra a parede. Será que o Estado Mínimo voltará a ganhar espaço? Será que se inicia uma nova fase dentro da evolução do sistema capitalista? É cedo para avaliar, mas não há dúvidas de que o mês de setembro, mais uma vez, entrará para a história dos Estados Unidos. Naquela ocasião, duas torres tombaram. Agora, tombam velhos paradigmas.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Classe Mérdia

Já faz algum tempo que a imprensa brasileira noticiou, com pompa, o crescimento da classe média. Agora, 52% dos brasileiros pertencem ao bolo do meio. O dinamismo econômico, a geração de empregos e mais um monte de blá blá blás teriam contribuído para a redução da pobreza e inclusão de milhões de brasileiros na classe média. E em dezembro o Papai Noel vem aí.

Estatística é uma coisa impressionante. Dá pra transformar a realidade apenas alterando alguns detalhes nas metodologias estatísticas. O Brasil pode ser a décima maior economia do planeta ou a décima quarta, o Rio pode ter menos homicídios que São Paulo ou se tornar a capital mais violenta, os pobres podem deixar de ser pobres. Tudo assim, na ponta do lápis, no visorzinho da calculadora.

Que a pobreza tem sido reduzida no país, bem, isto é incontestável. Algumas políticas (aliás, duramente criticadas pela classe média e pela elite) têm, sem dúvida, provocado efeitos positivos para os mais pobres. O Bolsa Família, por exemplo, vem contribuindo para o desenvolvimento do comércio no Nordeste. Já são três anos consecutivos de crescimento a taxas chinesas! E se o comércio cresce, cresce a produção, aumentam os empregos, aumenta a renda média da população, que impulsiona o consumo, que estimula o comércio...

Mas a nova classe média brasileira é, segundo a Fundação Getúlio Vargas, aquela constituída por famílias com renda mensal entre R$1065 e R$4591. Não, você não leu errado. Não é renda per capita. É renda familiar! De repente eu fiquei rico. Dormi classe média e acordei elite.

Enquanto eu vou ali a Paris fazer umas comprinhas, recomendo que vocês assistam este vídeo. É genial.

Nota: post motivado por debates virtuais com o Breno.

Mais do mesmo

Hoje os jornais amanheceram estampando, em suas capas, o interesse de José Serra, prefeito de São Paulo, em construir uma nova rodovia ligando Rio de Janeiro e São Paulo. O projeto estima custos de aproximadamente R$ 3 bilhões e a rodovia seguiria um traçado paralelo à já existente Via Dutra. O objetivo seria desafogar a rodovia, que, segundo o prefeito, estaria saturada.

Errar é humano, mas insistir nos erros é politicagem (leia-se sacanagem). Torrar mais dinheiro no fortalecimento de um sistema de transportes de base rodoviária altamente ineficiente e caro, pra não falar altamente poluente? Construir uma rodovia paralela a outra já existente quando a concessionária que opera a Via Dutra está criando vias marginais ao longo dos trechos mais críticos, como Rio-Nova Iguaçu? Engavetar o projeto de construção do trem de alta velocidade ligando as duas metrópoles e articulando a região industrial do Vale do Paraíba? Quem ganha com isso?

A princípio, apenas as empreiteiras. Mas eu duvido se estas mesmas empreiteiras não vão aparecer na prestação de contas da campanha Serra 2010 como principais doadoras.