Como o tempo sempre joga contra nós, não consegui manter o blog no ano passado. Sequer pretendia reativá-lo, mas a mais recente e absurda disputa política envolvendo o Rio de Janeiro me deu motivação suficiente para pelo menos mais este texto.
O deputado Ibsen Pinheiro, do PMDB do Rio Grande do Sul, propôs recentemente uma emenda que apresenta uma nova forma de gerir a distribuição dos royalties advindos da exploração do petróleo no Brasil. De forma simples e clara, isso beneficiaria todas as unidades da federação à exceção dos estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, sendo este o mais afetado.
Antes de qualquer avaliação da emenda é preciso compreender o que são os royalties, o centro desta discussão. Royalties podem ser entendidos como uma espécie de direito autoral, pago quando alguém ou alguma empresa explora comercialmente algo que não a pertence. Uma rádio paga 'royalties' à gravadora por montar sua programação com base em obras musicais alheias; empresas pagam royalties a outras empresas quando aplicam a um produto seu a tecnologia patenteada por outra empresa e, seguindo esta lógica, as empresas que exploram o petróleo na plataforma continental brasileira pagam royalties aos municípios e estados em cuja área o recurso é extraído porque estão lucrando com a comercialização de algo que não lhes pertence.
A atual forma de distribuição de royalties no Brasil remunera os municípios e estados produtores e leva em consideração outras questões além da acima exposta. Em primeiro lugar, a extração de petróleo gera danos ambientais que atingem diretamente a área onde o recurso é explorado. Em segundo lugar, a atividade de extração gera uma grande atração populacional para os municípios litorâneos do norte do estado do Rio de Janeiro, promovendo crescimento exponencial da população, sobrecarga sobre a estrutura urbana e sobre os serviços oferecidos nestes municípios. Mais gente pra estudar, pra adoecer, pra circular no transporte público, pra gerar lixo, pra poluir. O município de Rio das Ostras, por exemplo, teve acréscimento populacional de 105% entre 2000 e 2007, convive com constantes congestionamentos e observa o crescimento das taxas de criminalidade. Há que se considerar, ainda, que o petróleo é o único produto sobre o qual o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) incide no estado de consumo, não no estado de produção. Em outras palavras, o Rio de Janeiro concentra a produção de cerca de 80% do petróleo nacional, mas só recebe o ICMS que incide sobre a parte deste petróleo consumida no estado do Rio.
Por tudo isso, a política de distribuição de royalties é uma política compensatória, não um privilégio como muitos pensam. Ela remunera os municípios e estados produtores por todos os impactos negativos que a indústria petrolífera provoca.
A emenda Ibsen propõe que os royalties sejam distribuídos pelos estados seguindo a mesma regra que baseia a distribuição de recursos federais para o Fundo de Participação dos Estados. Assim, o Rio de Janeiro perderia cerca de R$7 bilhões anuais, deixando de ser o principal beneficiário para ocupar a amarga 22a. posição no ranking de recebimento de royalties num total de 26 estados. Resumindo, a emenda é um acinte. Absurda e imoral.
A Câmara dos Deputados e o Senado já a aprovaram. O presidente Lula pode vetar. Se vetar, cria um problema política com 24 estados brasileiros. Se não vetar, cria um problema político com 2 estados, sendo um deles, o Rio, um histórico reduto eleitoral do PT.
Considerando que estamos em ano eleitoral e que seja qual for a decisão do Lula, isso cria um problema político para o presidente, tudo aponta para uma mesma direção: a emenda Ibsen tem pretensões políticas, não econômicas. O deputado Ibsen Pinheiro não pretende com ela ganhar uns trocados às custas do Rio de Janeiro. Pretende, sim, ajudar a minar a candidatura de Dilma Roussef. E por fazer isso de forma imprudente, às custas de um estado, seus municípios e sua população, a emenda merece ser duramente repudiada.
Acompanhemos as cenas dos próximos capítulos...
O deputado Ibsen Pinheiro, do PMDB do Rio Grande do Sul, propôs recentemente uma emenda que apresenta uma nova forma de gerir a distribuição dos royalties advindos da exploração do petróleo no Brasil. De forma simples e clara, isso beneficiaria todas as unidades da federação à exceção dos estados do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, sendo este o mais afetado.
Antes de qualquer avaliação da emenda é preciso compreender o que são os royalties, o centro desta discussão. Royalties podem ser entendidos como uma espécie de direito autoral, pago quando alguém ou alguma empresa explora comercialmente algo que não a pertence. Uma rádio paga 'royalties' à gravadora por montar sua programação com base em obras musicais alheias; empresas pagam royalties a outras empresas quando aplicam a um produto seu a tecnologia patenteada por outra empresa e, seguindo esta lógica, as empresas que exploram o petróleo na plataforma continental brasileira pagam royalties aos municípios e estados em cuja área o recurso é extraído porque estão lucrando com a comercialização de algo que não lhes pertence.
A atual forma de distribuição de royalties no Brasil remunera os municípios e estados produtores e leva em consideração outras questões além da acima exposta. Em primeiro lugar, a extração de petróleo gera danos ambientais que atingem diretamente a área onde o recurso é explorado. Em segundo lugar, a atividade de extração gera uma grande atração populacional para os municípios litorâneos do norte do estado do Rio de Janeiro, promovendo crescimento exponencial da população, sobrecarga sobre a estrutura urbana e sobre os serviços oferecidos nestes municípios. Mais gente pra estudar, pra adoecer, pra circular no transporte público, pra gerar lixo, pra poluir. O município de Rio das Ostras, por exemplo, teve acréscimento populacional de 105% entre 2000 e 2007, convive com constantes congestionamentos e observa o crescimento das taxas de criminalidade. Há que se considerar, ainda, que o petróleo é o único produto sobre o qual o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) incide no estado de consumo, não no estado de produção. Em outras palavras, o Rio de Janeiro concentra a produção de cerca de 80% do petróleo nacional, mas só recebe o ICMS que incide sobre a parte deste petróleo consumida no estado do Rio.
Por tudo isso, a política de distribuição de royalties é uma política compensatória, não um privilégio como muitos pensam. Ela remunera os municípios e estados produtores por todos os impactos negativos que a indústria petrolífera provoca.
A emenda Ibsen propõe que os royalties sejam distribuídos pelos estados seguindo a mesma regra que baseia a distribuição de recursos federais para o Fundo de Participação dos Estados. Assim, o Rio de Janeiro perderia cerca de R$7 bilhões anuais, deixando de ser o principal beneficiário para ocupar a amarga 22a. posição no ranking de recebimento de royalties num total de 26 estados. Resumindo, a emenda é um acinte. Absurda e imoral.
A Câmara dos Deputados e o Senado já a aprovaram. O presidente Lula pode vetar. Se vetar, cria um problema política com 24 estados brasileiros. Se não vetar, cria um problema político com 2 estados, sendo um deles, o Rio, um histórico reduto eleitoral do PT.
Considerando que estamos em ano eleitoral e que seja qual for a decisão do Lula, isso cria um problema político para o presidente, tudo aponta para uma mesma direção: a emenda Ibsen tem pretensões políticas, não econômicas. O deputado Ibsen Pinheiro não pretende com ela ganhar uns trocados às custas do Rio de Janeiro. Pretende, sim, ajudar a minar a candidatura de Dilma Roussef. E por fazer isso de forma imprudente, às custas de um estado, seus municípios e sua população, a emenda merece ser duramente repudiada.
Acompanhemos as cenas dos próximos capítulos...
9 comentários:
Belo texto. Pedagógico e claríssimo, bem afastado do muro. Não só seus alunos, mas todos nós, que não estamos bem inteirados sobre esse assunto, agradecemos.
Bjs.
Eu não acho esse texto afastado do muro. Blog é opinião e opinião nunca é isenta. Porém, não condeno isso, ao contrário, acho que é saudável. Mas, discordo...
Em primeiro lugar, a definição de royalties está correta. Porém, o petróleo não "pertence" ao RJ ou ao ES ou às cidades. O petróleo está dentro do espaço territorial marinho brasileiro e, assim, é território federal e não estadual.
Em segundo lugar, partindo do ponto de vista compensatório, eu não acredito que nem o RJ, nem o ES e muito menos o RS (estado do qual sou nativo e onde moro) paguem ao PR, ao MS ou ao MT os royalties pelo uso da energia elétrica de Itaipu, que é produzida usando matéria-prima (água) da bacia hidrográfica que contempla esses três estados, e talvez outros que, por minhas limitações técnicas no assunto, não sei listar.
Em terceiro lugar, o impacto ambiental da atividade de extração de petróleo submarino não chega a ser significativo para as cidades envolvidas pois a plataforma estará a uma distância enorme dessas cidades.
E para finalizar, o impacto social nas cidades envolvidas já é mitigado pelo próprio aquecimento da economia local que é causado pelos maciços investimentos feitos, pelos empregos gerados e pelos impostos envolvidos em todas as atividades exercidas por essas pessoas empregadas. Ignorar isso é deturpar alguns fatos para benefício próprio.
Me inclino favorável à emenda do Ibsen pois acho que a divisão proposta inicialmente não é justa. O RJ e o ES não podem ficar com uma fatia absolutamente tão grande de tamanha riqueza que, na verdade, não lhes pertence. De maneira similar, os bilhões investidos em pesquisa sobre o pré-sal foram recolhidos de todos os estados da federação. Como todos investiram na pesquisa de um bem que a todos pertencem, acho mais do que justo que todos se beneficiem de fato com a exploração desse bem.
Vou explicar a metáfora. "Afastado do muro" é igual a longe do muro. Se a pessoa está longe do muro, ela não pode estar em cima do muro, porque né. Quem está em cima do muro tem o muro aos seus pés. Logo, afastado do muro é igual a ter opinião.
Faber, seu texto é claro, opinativo, pedagógico e bem escrito.
O companheiro Fernando pode se atualizar lendo o site da Itaipu Binacional onde vai descobrir que 15 municípios paranaenses recebem royalties pagos pela usina desde o início de sua operação. As justificativas são as mesmas que baseiam o pagamento dos royalties do petróleo.
Taí, se a emenda passar, proponho a bancada fluminense propôr a distribuição dos royalties de Itaipu, Tucuruí, a futura Belo Monte...
Segue o link: http://www.itaipu.gov.br/?q=pt/node/194
Dos 15 municípios paranaenses que recebem royalties tem alguns que perderam quase metade do seu território original para a barragem, terras muito produtivas... É só calcular qual a área que o RJ e o ES vão perder com as instalações para produção de petróleo e pagar essa quirera a mais de royalties a esses estados... resolvido. E o petróleo não é o único produto que paga ICMS no estado consumidor, isso é válido para a energia elétrica produzida em itaipu também, o PR é o maior exportador de energia no brasil e não recebe por isso... justo, injusto? O fato é que do jeito que era a distribuição não está justo, não dá, a esmagadora massa de brasileiros pensa assim. Eu até acho justo que quem produza receba um POUCO mais, mas não infinitamente mais, é um bem que está a quilômetros de distância tanto pra dentro quanto pro fundo do mar longe desses municípios e estados, é um bem do Brasil
Acho interessante que os argumentos sempre se baseiam num outro caso de injustiça, mas ao invés de defenderem a correção desses problemas, propõem a socialização das injustiças. "Se eu não recebo pela energia, então você também não recebe pelo petróleo".
Também é interessante pensar que 7 bilhões a menos para um estado faz A diferença, mas 7 bilhões divididos irregularmente por 26 estados não resolve a vida orçamentária de ninguém. No final das contas, ninguém ganha, só o Rio perde.
Caro Faber, não se trata de socialização da injustiça. O que o PR recebe é uma compensação pelo impacto ambiental e perda territorial gerados pela presença da usina. Olha o valor de "royalties" que a Itaipu já repassou... 3,67 bi de dólares em 25 anos. Só a fatia do RJ é maior que isso ANUALMENTE.
O que acontece com RJ e ES não é nem parecido com isso... da maneira como está, esses estados praticamente são SÓCIOS da Petrobras, o que é uma palhaçada, visto que nem o governo do RJ nem o do ES possuem percentual algum do bolo societário da empresa.
Que o RJ e o ES devem ser compensados, não tenho dúvidas... mas isso deve ser feito com a parte dos royalties que cabem à União. Um repasse para compensar todo o custo social e ambiental que é causado ao RJ e ao ES.
Justificar que 7 bilhões é quase nada para os outros 25 estados, mas é muito para o Rio, é a mesma coisa. Socializar a injustiça.
Que há perdas grandes para o Rio, é evidente. Só acho que é totalmente descabido o funcionamento atual desse sistema de royalties. Talvez o RJ e o ES consigam alguma coisa na base do direito adquirido, o que é legal, embora nem sempre ético, pelo menos na minha concepção.
Mas para cargo de comparação, a Lei Kandir, nos anos 90, retirou do RS (e outros estados) uma arrecadação com exportações tão importante quanto são os royalties para o RJ. A União se comprometeu a compensar financeiramente vários estados por essa perda, mas até hoje o RS pleiteia por essa compensação. Porém, não há dúvidas de que era a coisa certa a se fazer.
Vcs sabiam que tem um caso de um municipio que recebe royalties da Petrobras que chegou ao cúmulo de usar porcelanato nobre em calçadas de beira de praia? E enquanto isso existem municípios que mal tem dinheiro pra folha salarial, e folha salarial municipal não é só vereador e acessor, são professores, médicos da saúde básica... E são bem esses municípios que qualquer trocado a mais fará a diferença, e essa diferença salvará vidas inclusive. Eu sei que o Rio de Janeiro agora vai ter dificuldades de fazer a mega infraestrutura pra Copa e pras Olimpíadas (balela), mas muitos municípios vão poder ter um médico e um postinho de saúde... Quanta injustiça essa lei! Ainda bem que a esmagadora maioria da Câmara assim o quer, ainda bem...
fico feliz por vcs discutirem isso, pois eu tenho que fazer uma redação sobre o impacto na economia do rj e não estou entendendo nada.
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